terça-feira, 18 de setembro de 2012


AOS AMIGOS...
UM BELO TEXTO DA PROFª TÂNIA LIMA


Amigos são pra essas coisas: Salve ! Como é que vai !?

Sempre soube que um bom amigo é para o resto da vida. Às vezes basta um perfume, uma música, um livro, um lugar, um gesto apenas para nos recordar a presença desse nosso anjo da guarda [concreto], o AMIGO.
            Quem nunca teve um amigo, um amigo irmão, desses que estão com a gente desde o princípio da primavera até o final da nossa estação? Quem nunca teve amigo amante, desses que a gente vê pouco e ama sempre. Quem nunca teve amigo distante, de notícias longínquas em caixa-postal, e-mail, orkut etc e tal. Quem nunca teve um amigo do peito, desses que a gente guarda como travesseiro e que nos conhece até o dedão do pé. Quem nunca teve amigos exagerados, desses que fazem uma feita e conta ter feito mil só para se mostrarem interessante perante nosso afeto? Quem nunca teve um amigo da onça, que nos faz passar vexame, dá calote em nosso nome, nos leva à falência, mesmo assim a gente nunca esquece, fica carimbado como cheque sem fundo no inconsciente. Quem nunca teve um amigo de aventura errante, que só acertam à porta de nossa casa para chorar as dores, o cotovelo.
 Quem nunca teve amigo confidente que guarda nosso segredo e não abre nem pro trem. Quem nunca teve um amigo vizinho, do tipo que nos empresta a sala, os discos, os livros, o filme, o açúcar, o cafezinho e o afeto doce-predileto. Quem nunca foi funcionário da amizade, bateu ponto em conselhos, fez horas extras de escuta e até representou Freud, Lacan, Jung? Quem nunca bateu com um sorriso de amigo no meio do trânsito - é aquela gritaria infernal - ninguém se entende. Hi! Hi! Hi! Há! Há! Há! Um abraço e nunca mais. Quem nunca ficou plantado frente à tv assistindo estórias de Tom e Jerry, Fred e Barney, Batman e Robim, Gordo e Magro. Ser amigo a valer não é fácil. Conservar uma boa amizade, então? Há amigos que ficam na construção diária. Rubem Braga pedia que, a cada final de ano, passássemos a limpo nossa caderneta de endereços. A cada ano há pessoas que entram e saem de nosso círculo de amizade. Outros se tornam colegas que os acontecimentos levam para o tempo. Esses passam como tudo na vida. Também passarinham para uns aqui; para outros acolá. Não acertamos sempre na amizade. O humano acampa 'ser e tempo'.
Há cuidados e descuidos que levamos a enfrentar a vida.  Amigo é presente doado de generosidade. Não se compra. Não se camufla. Se se falsifica, o nome é outra coisa diferente.  Na hora H, na hora da bomba explodir, BUMM!! Pronto explodiu! Mas lá está ele, o amigo fiel feito um cão, um gato, a proteger, a socorrer o protegido, das garras do leão. Pronto engoliu o leão e salvou o amigão!
Há muitos tipos de amigos, há uma diversidade de amizades que não cabem em conceitos. Alguns bichinhos são amigos leais. Guimarães Rosa acreditava no fascínio da amizade e mistérios que os gatos continham.  Hilda Hilst tinha uma predileção por cachorros. Clarice Lispector uma vez ao ser indagada sobre o que era morte, respondeu: "- Meu cachorrinho Ulisses a me procurar pela casa inteira e não me encontrando".   Quem não lembra da cachorrinha Baleia do mestre Graciliano. Na ficção machadiana, o cão é amigo crucial nas cenas de Quincas Borba. Em sintonia com a geração do pós- guerra, a escritora  Lígia Fagundes Teles fez uma historinha curiosa envolvendo a amizade de um cachorro e um combatente, assim como um filme de segunda guerra,  o conto ligiano traz um final infeliz para desagrado do leitor amigo.
 Se a modernidade é ou não inviável para a amizade, não temos certeza; há um niilismo profundo que perpassa a ótica de valores."É arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber, reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo e abrir espaço", observa Ítalo Calvino em As cidades Invisíveis.
Uma boa dose de cuidado mútuo comunga a proteção do gesto. A manutenção de uma amizade faz crescer o afeto favorito: o "Invisível aos olhos". O repartir o pão sem nada em troca. Ser COM lembra Leonardo Boff.  Uma empatia disponível para ver o outro crescer junto. No budismo, não há amigos nem inimigos. O que há é um sentimento em construção.  
Não há regras para Ter ou não ser amigo. Ser bom e justo Sem medo do ridículo à moda do rei Salomão. Tudo que no outro toca de calor humano tem alma, tem ser. As almas se comunicam antes de se conhecerem. Amizade, às vezes, não precisa da fala. Alguns silêncios exigem um aprendizado de desaprender. Saber ouvir-se a si mesmo. Há silêncios brancos que são grandiosos. Outros são incomunicáveis entre si. Alguns estão "caminhados para o nada". O que há de bonito no "mundo é fazer as asas crescerem", lembrando Saramago.  
É saudável agradecer o amigo. É único. São seres tão apaixonantes que lhe devemos não apenas um gesto, um favor, uma gratidão, mas a própria vida.  Para Mário Quintana que, inventou a amizade de um peixinho com um pescador: "uma amizade sabe-se ouvir a distâncias".
Quem nunca repetiu aquelas frases surradas pelo vento: "Calma", "tudo vai dar certo", " a vida continua", "pra tudo há saídas", nada como um dia atrás do outro", você vai ver,  meu amigo". Quem não ouviu falar das histórias de Dom Quixote e seu fiel escudeiro Sancho Pança. Quem não leu a conversa de dois amigos em Dublin no livrinho Ulisses, de Joyce. Como não lembrar da amizade de Jorge Amado e o pintor Caribé...
Quem não assistiu ao filme Carlitos e seus amigos sem deixar escorrer uma lágrima, um aperto: -"Há Hannah, está me ouvindo? Onde te encontres, levante os olhos...!"

 Tânia Lima - Jornal Almanac Cultural - Ceará, em 2000.
________________________________
Colaboração do leitor DIDI AVELINO, RJ

Nenhum comentário:

Postar um comentário