sábado, 24 de novembro de 2012


UMA VIAGEM INESQUECÍVEL -  Primeira parte
Ormuz Barbalho Simonetti

            Tudo começou quando resolvi descansar por uns dias, após o lançamento do meu livro “A Praia da Pipa do tempo dos meus avós”, em outro país, já que nunca havia atravessado nossas fronteiras.
            Entretanto, o primeiro desafio era convencer minha esposa a fazer a viagem de avião. Vários pousos e decolagens a esperavam, e só em comentar o fato, ela ficava deveras apavorada. 
            Depois de muita conversa ao pé do ouvido, recheadas de promessas em sua maioria, impossíveis de serem cumpridas, lhe convenci a ir para o “sacrifício”. Resolvida a primeira etapa, tive a grata surpresa da companhia de dois casais amigos, que se juntaria a nós, nessa aventura além-fronteiras, em terras de língua espanhola. Um dos casais, pais do meu genro, e o outro, seu filho, que viajava com sua esposa. Não poderia haver melhores companhias. Minha esposa, por sua vez, ficou mais confiante e eu, agradecido pela sorte de ter aquelas pessoas conosco, numa aventura com duração prevista para 10 dias.
            Parecia que tudo estava se encaixando como uma luva. Seria uma viagem inesquecível, já que para mim, minha esposa e um dos casais, fazíamos nossa primeira viagem internacional.
            Realmente foi “inesquecível” em todos os sentidos. Começou quando adquirimos, através do site da TAM, as seis passagens Natal/São Paulo/Chile. Na ocasião de confirmar a compra, nos enganamos quanto à data do embarque. Descobrimos depois que havíamos adquirido os bilhetes 30 dias antes do dia em que pretendíamos viajar. Resultado: perdemos todas as passagens, pois como os bilhetes foram adquiridos em uma promoção, mesmo comunicando com antecedência, como foi o nosso caso, a TAM não permitiu fazer troca, substituição ou remarcação para o dia do embarque.
            No dia que antecedeu a viagem amanheci com uma enorme dor no calcanhar direito. Logo suspeitei da famosa “gota”, pois, vez por outra, quando me excedo nos miúdos e carne vermelha, ela logo se apresenta. Felizmente depois de uma consulta ao médico, constatamos que se tratava apenas de uma tendinite, enfermidade não menos preocupante, principalmente para quem vai fazer uma viagem de turismo e normalmente precisa caminhar grandes distâncias. Explicada ao médico a minha condição de viajante naquela madrugada, o problema foi equacionado com uma potente injeção à base de corticóide. Enfim, na madrugada do dia 1 de novembro, partimos de Natal com destino a São Paulo.
            Após uma hora e meia de vôo, de repente o silêncio da aeronave era rompido por um grito de pavor. Depressa! Depressa! ... era a esposa de um dos meus amigos, que muito aflita, chamava a aeromoça. Olhei para trás e também me assustei com a cena. Com a cabeça pendendo para um dos lados, seu marido desfalecia. Passou mal e veio a desmaiar por falta de oxigênio. Seu organismo, por problemas pulmonares, às vezes não consegue fazer a troca do oxigênio respirado no ambiente pressurizado da aeronave, o que provocou o seu desfalecimento.
            Tínhamos conhecimento do seu problema pulmonar, pois a mesma situação já havia acontecido em outro vôo, quando íamos para Gramado-RS, onde fomos assistir ao espetáculo do Natal Luz. Nesse episódio, só tivemos conhecimento do fato, quando pousamos em Natal, e nos revelou que havia sofrido do mesmo desconforto durante o vôo, só tornando quando a aeronave se preparava para o pouso. Como era um vôo noturno, nem mesmo sua esposa percebeu o ocorrido.
            Entretanto, nessa viagem, não tivemos maiores preocupação, pois dias antes ele havia feito todos os exames e, consultando do seu médico acerca do problema, dele obteve um atestado que foi apresentado à tripulação, por ocasião do embarque, informando que o mesmo sofria de problemas respiratórios, (hipóxia hipobárica: deficiência de oxigênio nos tecidos consequente à diminuição da pressão parcial do oxigênio no ar respirado), e recomendava que ele fosse ofertado oxigênio, caso houvesse necessidade. Ficou previamente acertado com a tripulação, que se houvesse necessidade ele acionaria um dispositivo localizado acima de seu assento.
            O dispositivo foi aceso e imediatamente é socorrido pela tripulação, que prontamente lhe atende com uma garrafa de oxigênio. Dez minutos depois que retoma a respiração normal, um dos tripulantes solicita a presença de algum médico, que por acaso estivesse a bordo. Apresentou-se uma médica, que por sinal era do seu circulo de amizade, e gentilmente lhe faz companhia até o desembarque em São Paulo.
            Desembarcamos em Guarulhos pouco mais das seis horas, de uma manhã ensolarada. Três horas depois, reembarcávamos com destino a Santiago do Chile. Após tomarmos assento, sentimos a falta do nosso companheiro. Depois de algum tempo, fomos informados pelo seu filho que ele havia sido impedido de embarcar, sob a alegação de que a aeronave não dispunha de oxigênio suficiente, caso houvesse necessidade durante o vôo Guarulhos-Santiago. A tripulação recusava-se terminantemente a autorizar seu embarque, temendo a repetição do ocorrido no vôo entre Natal e São Paulo.   
            A aeronave continuava estacionada aguardando a solução da pendência. Logo, fomos informados que ele só poderia viajar no dia seguinte e com equipamento próprio (Concentrador de Oxigênio para uso aeronáutico). Teria que adquirir, por sua conta, uma garrafa de oxigênio. Esse equipamento ainda teria que ser submetido a analise da TAM. Também foi exigido a compra de outro bilhete, pois o equipamento – uma garrafa de oxigênio -, viajaria na poltrona vizinha.
            Seu filho resolve que acompanharia o pai, para ajudá-lo nas providências, na certeza que chegariam ao Chile no dia seguinte. Enquanto a aeronave taxiava, recebe uma mensagem do guichê da TAM para interromper a manobra e aguardar. Na confusão criada por não poder embarcar, meu amigo esqueceu que o documento de identidade de sua esposa estava com ele. Sem a posse desse documento, ela não passaria pelo balcão da emigração e teria que retornar ao Brasil. Poucos minutos depois, um dos tripulantes dirige-se a ela e lhe entrega o documento que um funcionário da companhia viera às pressas entregar no avião. Inicia-se novo taxiamento e mais uma vez é interrompido. Os passageiros já começavam a se perguntar o que estaria acontecendo quando novamente o mesmo tripulante, com cara de poucos amigos, entrega a esposa do meu outro amigo sua identidade, que também havia ficado com ele e que certamente acarretaria o mesmo problema no desembarque.
            Ufa! Enfim partimos. Lá estava eu, com a cabeça a mil, me perguntando como seria o desembarque em Santiago, já que eu era cego de guia, em se tratando de outro país. Mas, nada podia fazer. Dentro daquele enorme avião, me sentia menor que um grão de mostarda diante do que estava por vir e como se diz lá pelo interior do mato, estava literalmente pelo beiço.
            As horas se passavam e a preocupação me atormentava. Eu, dando uma de Cadinho, personagem da novela Avenida Brasil, responsável pelas três mulheres sem saber o rumo que tomaria.
            De repente passa uma aeromoça distribuindo com os passageiros um formulário escrito em espanhol. Embora identificando algumas palavras, não conseguia entender completamente o que estava escrito naquele papel.
            Quando se viaja para outro país, os amigos que por ventura lá já estiveram, logo se apressam em informar o endereço de onde se faz boas compras, onde se localizam os bons restaurantes, os locais de visita indispensáveis,  os melhores passeios etc. Infelizmente, não se preocupam em informar ao passageiro de primeira viagem que, para ser admitido em outro país, é necessário passar pela policia de emigração, e que aquele tal papel que recebemos da aeromoça, é justamente para ser preenchido com nossos dados, que serão confrontados com o nossos documentos de identidade pelo policial da emigração. Após esse procedimento, nossa entrada é autorizada através de um carimbo, que a determinará nossa permanecia no país. A guarda desse documento também tem a mesma importância, pois por ocasião da saída do país, o mesmo documento será exigido.
            Preenchemos o documento da maneira que achávamos ser o mais correto, porém, isso teve lá suas conseqüências, quando apresentado no guichê da emigração. A policial chilena, muito mal humorada, talvez fosse uma solteirona mal amada, pois era desprovida de qualquer sinal de beleza estética, terminou por se aborrecer, em virtude da falta de alguns dados, que tiveram que ser refeitos ou complementados. Até que estabelecêssemos um mínimo de comunicação, com aquela chilena raivosa, falando apressadamente e em um espanhol de difícil compreensão, passamos por alguns minutos de intenso estresse.
            Enfim, tomamos um taxi, que tive o cuidado de contratar dentro do aeroporto, evitando assim outros problemas. Depois de nos acomodar na van, já que éramos quatro passageiros e bagagem de seis pessoas, solicitei ao taxista, com ares de viajante experiente: Hotel Neruda, por favor! Sim señhor, respondeu o chileno.
            Durante o percurso em direção ao hotel, uma distância de 35 a 40 quilômetros, procurei manter algum diálogo com o chofer, para ir me familiarizando com o idioma. Perguntei-lhe sobre a distância até o centro da cidade, sobre a temperatura e por fim sobre os pontos turísticos mais visitados. Ele, muito educado, procurava de todas as maneiras atender aos meus questionamentos e satisfazer minhas curiosidades. Foi então que atônito, descobri mais uma falta de sorte.
            O dia seguinte, sexta feira dois de novembro, é dedicado aos mortos, como na maioria dos países que têm como predominância a religião católica, entre os quais o Chile se inclui, era feriado nacional. E o dia 3, sábado, o comércio funcionaria precariamente em razão do feriado anterior. Resultado: dois dias com praticamente tudo fechado em Santiago. Somente os Shoppings, como de costume, estariam em pleno funcionamento.
            Chegamos ao hotel. Após a retirada da bagagem fomos à recepção para as providências de praxe e já sonhando com um banho quente que certamente nos traria alguns momentos de merecido relaxamento, notamos a ansiedade da recepcionista, que não obstante intensa procura, não conseguia encontrar nossos vauchers. Mais uma vez, fomos tomados pelo estresse. Alguns minutos depois fomos informados que estávamos no hotel errado. Questionamos quanto ao nome do hotel que constava em nossos vauchers, e descobrimos que o taxista havia nos deixado, como foi solicitado, no Hotel Neruda, porém, para nossa surpresa, o nosso hotel era o Neruda Express, que fica do outro lado da cidade. 

    




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