sábado, 9 de fevereiro de 2013


                        O Primeiro Clarim Parte I
                   Ciro José Tavares

Hoje eu não quero sofrer,
hoje eu não quero chorar,
deixei a tristeza lá fora,
mandei a saudade esperar.”
Esses quatro versos abrem a música de klécius Caldas, O Primeiro Clarim, que dá título aos comentários sobre antigos carnavais de Natal, incluídos no livro Sagrados Quarteirões, onde renovo minhas lembranças da cidade que fugiu num tempo que deixou de existir e jamais voltará.
Sexta-feira, véspera do sábado do Zé Pereira, era o dia dos arremates num encontro na casa do Ugo Paiva. Ali estávamos Marcos Massena, Fernando Paiva, Valmir Ferreira Márcio Pacheco, Sidney Gurgel, Carlos Alberto Silva Gomes, Nei e Nélio Silveira Dias, Túlio Fernandes, Eimar Villar, Oriane Guedes, José Gondim, Ilo e Jarbas Ramalho, José Evaldo, Reginaldo Feijó, João Bosco Ferreira e eu. Definíamos os horários de saída, as casas comprometidas com os assaltos, acertávamos com “Maribondo”, um corneteiro da Polícia que nos acompanhava, comandando a parte musical.
Na Rua Felipe Camarão, esquina da Rua João Pessoa, ao lado da casa de Reginaldo Feijó, o caminhão que nos transportaria durante os três dias, recebia os últimos retoques da alegoria. Reginaldo era um artista nato e deixávamos que ele cuidasse dessa parte, pois sabia fazer e fazia com carinho. O nome PLEBE eu pesquei de um comentário azedo do irmão Adauto Aguiar, meu professor de latim e inglês no Colégio Marista. Ele fez uma dura crítica às diferenças sociais concluindo ao final que elas, como na Roma antiga, eram responsáveis pelo surgimento das classes menos privilegiadas, a plebe rude e sem futuro. Fomos Ugo, a irmã Ize, a mãe deles, dona Carminha Paiva, e eu que fechamos com o nome. D. Carminha comprometeu-se em pedir ao compositor Hianto de Almeida a marcha hino do bloco que nascia sem estatuto, sem regulamento, sem diretoria. Todos falavam e davam sugestões, mas havia ordem porque todos queriam brincar um bom carnaval. Um bloco feito na base da amizade, um amigo chamando outro, o nome submetido aos demais e quando aprovado passava a integrar o grupo como novo plebeu.
Nosso carnaval começava na noite dos KARFAJESTES, na antiga sede do ABC, na Avenida Afonso Pena com a Rua Potengi. O bloco reunia um grupo da pesada, empresários e profissionais liberais, todos bem encaminhados na vida, entre eles Jair Navarro, Valdemar Matoso, Rubélio Lins Bahia, Moacir Maia, Wellington Lucena, José Gosson e Walter Tavares. A festa era animada, todos embalados na abertura oficial do tríduo momesco, uma chuva de confete e serpentinas, o agradável cheiro dos lança-perfumes, as músicas cantadas com entusiasmo, pois sabíamos suas letras, principalmente aquelas que falavam de amor: “Se você não me queria não devia me procurar; não devia me iludir, nem deixar eu me apaixonar.”
Como na música de klécius Caldas estávamos todos imbuídos de um único projeto:
“Quero me afogar em serpentinas,
quando ouvir o primeiro clarim tocar;
Quero ver milhões de colombinas
a cantar;a cantar;
quero me perder de mão em mão,
quero ser ninguém na multidão.”

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