quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013


Por Franklin Jorge l Novo Jornal [17 de fevereiro de 2013]
O RN deve ao folclorista Deífilo Gurgel uma obra que põe em relevo o nome do autor e o projeta no espaço e no tempo por essa contribuição aos estudiosos da Cultura Popular. Fortuna que amealhou em árdua e perseverante pesquisa de campo que o levou por todo o território norte-rio-grandense, em trabalho que resultou numa coleta que enriquece, especialmente, os estudos do Folclore no Brasil.
Durante uma década em que se desdobrou para ouvir e anotar o que sobreviveu na memória do povo – e que fatalmente teria se perdido sem a sua colaboração –, fez Deífilo, com inegável generosidade e paciência, a primeira etapa de um processo que encontrará seus cultores, uma gente mais subsidiada pela erudição capaz de analisar, classificar, interpretar, contextualizar e ampliar os frutos dessa inestimável coleta.
Em 1985, aos 60 anos, deu início a uma pesquisa inspirada por achados que anteriormente fizera, ao embrenhar-se nesse projeto. Colheu de suas conversas com uns e outros uma herança cultural e entregou-se Deífilo, de corpo e alma, a um trabalho absorvente e exaustivo que o escravizaria por toda uma década, quando já lhe pesava a idade e os anos trabalhados.
Nesse afã, esquadrinhou o território norte-rio-grandense à procura de raridades que sobreviviam na memória do povo e as encontrou sob a forma de romanceiros ibero-portugueses que nos chegaram com os colonizadores e, nesse percurso, enriqueceu-nos com a descoberta de romanceiros mais recentes, escritos por gente daqui, como Fabião das Queimadas, escravo que alforriou-se a si mesmo, à sua mãe e a uma sobrinha com quem se casou, cantando pelas feiras do Agreste ao som de sua rabequinha.
Refiro-me ao Romanceiro Potiguar, um acontecimento que traz à luz uma tradição oral que sobreviveu à passagem do tempo em comunidades rurais esquecidas. Romances e xácaras que se cantavam nas feiras e nas festas domésticas e devocionais, encontraram em Deífilo o seu salvador inconteste.
Lendo-o, reencontro consignadas em seu livro versões do Romance de Juliana e Dom Jorge, colhidas de Francisco Canindé da Silva e de Atanásio Salustino do Nascimento, agricultor no Sítio Oiteiro, no município de São Gonçalo do Amarante, que nos deu a versão mais próxima do original anônimo que passou da Espanha para Portugal e de Portugal para o Brasil. Já a versão do palhaço Faísca, cognome de Francisco Canindé – conhecido entre nós por sua interpretação do “Velho”, personagem picaresca que conduz o Pastoril e espicaça o prazer do auditório com suas piadas licenciosas e cheias de sugestões libidinosas -, é um texto estropiado que só vale a título de curiosidade.
Meticuloso, informa-nos Deífilo que coletou 29 versões desse romance, enumeradas a seguir:
    .Isabel Poti, Ceará-Mirim (1978). Josefa Joana da Conceição, Abrigo Juvino Barreto, Natal (1978). MARIA DE Aleixo, Alcaçuz, Nísia Floresta (1985). Isabel Joaquina do Nascimento, Alcaçuz (1985). Luísa F. Marques, Sítio Moreira, Pedro Velho (1985). Francisca Tavares, Lagoa do Sal, Touros (1985). Geralda Batista de Moura, Touros (1985). Dona Conceição, Lagoa do Sal, Touros (1986). Juvina Monteiro Lourenço, Rio do Fogo, Maranguape (1986). Dona Zulima, Campo de Santana, Nísia Floresta (1986). Dona Helena, Carnaubinha, Touros (1986). Dona Dalvanira, Alecrim, Natal (1986). Maria Barbosa, Apodi, (1987). Sebastiana M. Vale, Redonda, Areia Branca (1987). Moreninha, Genipabu, Estremoz (1987). Dona Moça, Curral de Baixo (1988). Maria José de Oliveira, Estremoz (1988). Dona Sulina, Baía Formosa (1988). Ana Luís Nascimento, Laranjeiras do Abdias, São Jose de Mipibu (1988). Maria Júlia, Caraúbas, Maxanraguape (1988). Cícera Xavier, Caraúbas, Maxaranguape (1988). Josefa da Conceição, Maracajaú (1989). Maria Silva, Acari (1990). Berta Lopes, Redinha (1991). Maria José (Militana Salustino), Sítio Oiteiro, São Gonçalo do Amarante (1991). Maria Ribeiro, São José, Touros (1992). Terezinha Alexandre, Lagoa Nova (1993). Terezinha Soares, Espírito Santo (1993). Ana Ferreira Dantas, Carnaúba dos Dantas (1993).
Publicado postumamente, o ano passado, Romanceiro Potiguar é o 21º volume da Coleção Cultura Potiguar da Secretaria Extraordinária da Cultura. Uma obra de longo alcance que aumenta nossa fortuna cultural. Livro que faz de seu autor um indiscutível patrono da pesquisa folclórica.

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