quarta-feira, 20 de novembro de 2013


ESTUDANTE OU ALUNO?

PADRE JOÃO MEDEIROS FILHO (pe.medeiros@hotmail.com)

O tempora, o mores! Como nos faz falta o latim! Se, mesmo, outrora, fazendo parte dos componentes curriculares das escolas, o poeta parnasiano exclamara: “A última flor do Lácio, inculta e bela”, o que diria esse vate nos dias atuais? Indagado sobre o significado da palavra inculta, empregada em seu soneto, respondeu Bilac: “o termo fica por conta de todos aqueles que a maltratam, mas que continua a ser bela”. Sem o ensino do latim nas instituições de ensino fundamental e médio, atropelamos ainda mais o vernáculo.

Quantas vezes, deparamo-nos com afirmações e fatos, partindo do modismo do “politicamente correto”, sem base científica, que surgem do nada e de repente têm trânsito livre nos campi universitários e até nas salas do Ministério da Educação. Adotou-se agora a moda do vocábulo estudante em lugar de aluno. É um risco, pois podemos transformar um sofisma em verdade, e, então consagrá-lo como certo e convencer incautos neste assunto. Há um conceito distorcido, que vem sendo divulgado inclusive entre professores e dirigentes educacionais. E diga-se, per transennam, empregado e enfatizado por palestrantes e orientadores pedagógicos. Trata-se da etimologia da palavra aluno

A nova conotação vem ocupando espaço, explicando que aluno significa "sem luz", pois a palavra é formada pelo prefixo grego “a” (partícula de negação) e pelo elemento “lun”, adulteração de lumen (luz em latim). E, por significar ausência dela, a palavra seria depreciativa e antipedagógica. Para quem estudou latim, sabe que as palavras em português provêm do acusativo, que integra a declinação latina. Caso o étimo aluno derivasse de lumen, substantivo neutro, deveríamos ter ad lumen (próximo da luz), como é a regra geral etimológica. Entretanto, a palavra aluno deriva do latim: alumnus e já existia, antes de Cristo. Tinha como significado primitivo criança de peito, que era nutrida, unida a sua mãe. Daí, o sentido figurado de aluno ou discípulo, enquanto é alimentado, vinculado a alguém. De acordo com o filólogo Ernesto Faria, (catedrático de latim da antiga Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil), Cícero já empregava alumnus, nas suas obras Verrinas e De finibus.  Segundo renomados etimólogos, latinistas e linguistas brasileiros, dentre os quais Antenor Nascentes, padre Auguste Magne, S.J, Serafim da Silva Neto e outros, alumnus deriva do verbo alere: alimentar, fazer crescer, desenvolver. Por analogia, tomou a acepção de crescimento intelectual. É também nesse sentido usado por Cícero em: De Natura Deorum e nas Catilinárias

Seria de bom alvitre que os leitores consultassem o verbete nos Dicionários da Língua Portuguesa de Houaiss e Aurélio, no Dicionário Etimológico Nova Fronteira de A. G. Cunha, nos dicionários da Real Academia Espanhola, Larousse etc. Não se pode aceitar que em nome do “politicamente correto” desvirtue-se a semântica de uma palavra, dando-lhe um sentido que não lhe cabe, banindo o seu uso. É aviltar e empobrecer nosso idioma e a história da educação.

Convém por último ressaltar que, na tradição, bem como nas culturas hebraica, grega, latina e brasileira, aluno é sempre alguém que está inserido, ou seja, matriculado numa instituição e vinculado a um mestre. Por isso, estão consagradas expressões como: aluno do Ateneu, do Salesiano, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte,  do curso de medicina, do professor Otto Guerra etc. Data venia, não podemos aceitar uma conceituação equivocada de aluno. Seria agredir os lexicógrafos e a língua pátria. Dom José Adelino Dantas, de saudosa memória, exímio latinista, proferiu esta frase lapidar: “Sem conhecimento do latim, podemos nos tornar apedeutas com certa pavonice". Cabe-nos, por fim, dizer: “Foeci quod potui, potentes faciant meliora”. E, já que não se estuda mais latim, procure-se a tradução no “doutor” Google, guru virtual de muitos.

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