sábado, 9 de novembro de 2013


SÓ SAUDADES


Paulo Molin, por Carlos Gomes

 
 
Paulo Molin, quando garoto
 
 
PAULO MOLIN
(Carlos Roberto de Miranda Gomes, ex-integrante da Rádio Poti)

Após mais uma noite insone, como vem ocorrendo nestes últimos meses, aguardo amanhecer com extrema ansiedade e, logo nos últimos instantes da madrugada, religiosamente, chegam os jornais do dia.

No último sábado, ao abrir a Tribuna do Norte, deparo-me com o artigo do meu amigo Woden Madruga: “Paulo Molin”, despertando-me imediata curiosidade em razão da afinidade com a pessoa nominada. Não era a notícia que aguardava há tantos anos, mas a informação de que falecera aos 66 anos em um hospital do interior de São Paulo.
Recostei-me, fechei os olhos e busquei das prateleiras da memória o passado, o nordeste do final dos anos 40 para começo dos 50. Natal com os seus 400 mil habitantes, serena, romântica, solidária.

A Rádio Educadora de Natal – REN, a Sociedade Artística Estudantil – SAE, a juventude ativa nas atividades artísticas. O prédio da ladeira da Rádio Poti em remodelação para assumir o seu futuro e os seus programas iam sendo deslocados para os Cinemas São Luiz, Rex e Rio Grande. Vesperal dos Brotinhos aos sábados, com Luiz Cordeiro; Domingo Alegre, sob a batuta do “Cacique Genar Wanderley” e à noite o Turbilhão de Novidades de Jaime Queiroz. Orquestras de Júlio Granados e Jonathas Albuquerque, regional com Gil Barbosa, Duca Nunes, Renato Tito e outros que já não mais me lembro. À margem dos grandes artistas, os meninos talentosos Odúlio Botelho, Edmilson Avelino, José Filho, Paulo Eduardo Firmo de Moura, Denise Vieira, Dulce Maria e Laudicéia Paiva e, no meio destes, Agnaldo Rayol, Elino Julião e eu, então conhecido como Carlos Gomes.

Concursos de calouros patrocinados por Vic-Maltema e a Voz de Ouro ABC, programas de auditório sempre lotados. Atrações semanais de nomes famosos nacionais e internacionais. Esses eram os anos dourados de Natal.

De Fortaleza tínhamos Keila Vidigal, Solteiro e Fátima. Do Recife, considerada a “Meca” do nordeste, despontava PAULO MOLIN, o melhor de todos: “A época em que isto aconteceu era propícia aos pequenos cantores. Em Recife, principalmente, era de se invejar o entusiasmo das platéias pela voz de Paulo Molin” (trecho de reportagem do jornalista Sebastião Carvalho em 1954, em o Diário de Natal, que tinha por título ‘Carlos Gomes e a ação do tempo”.

Os discos de 78 rotações de PAULO MOLIN eram disputados. Ali estavam consagradas as criações de Capiba Olinda, Cidade Eterna (Continental, 1950), Recife, Cidade Lendária (Continental, 1950), Igarassu, Cidade do Passado (Continental, 1951) as quais foram remasterizadas em CD, no Projeto Reviver, com o nome “Pernambucanos simplesmente”.

Todos queriam imitá-lo. Eu tive maior sorte, logrei ser o Campeão Vic-Maltema 1950, e em uma das etapas do concurso recebi a medalha daquele ícone da mauricéia. Fiz viagem ao Ceará (PRE-9, Rádio Clube), onde cantei com a orquestra de Mozart Brandão e fui acompanhado pelo violonista Evaldo Gouveia, do Trio Nagô e hoje estrela de primeira grandeza. Contratado para temporada na Rádio Tamandaré do Recife, resolvi abandonar o rádio e o meu contrato foi cumprido por Agnaldo Rayol.

Mas …existe o tempo implacável … (como dizia Sebastião Carvalho em sua reportagem). O destino daqueles “meninos prodígios” foi bastante diversificado – uns venceram na profissão liberal, José Filho e as meninas nunca mais tive notícias, Paulo Eduardo faleceu prematuramente, Edmilson andou pelas veredas do cárcere, enfrentou grandes dificuldades até a viagem definitiva para outra dimensão, Paulo Eduardo faleceu prematuramente. Permaneceram na carreira, apenas, Agnaldo e Elino.

PAULO MOLIN teve uma carreira meteórica. Na idade adulta chegou a gravar outro disco. Uma das músicas era “Bem Sabes”, sem qualquer sucesso. Sua voz estava irreconhecível e tudo ficou por aí.

Eu nunca esqueci dele, apesar de não mais viver no meio artístico, mas não consegui notícias precisas do seu paradeiro, nem mesmo em Recife onde vivi algum tempo.

Muitos anos depois li uma reportagem em revista nacional que dava conta de PAULO MOLIN como empresário no interior de São Paulo. A fotografia já não lembrava aquele menino bonito, cabelos encaracolados, olhos claros de outrora. Então os cabelos rareavam. Daí para cá somente a notícia de Woden.

Vieram-me lágrimas atrevidas e na noite seguinte, também insone, meus ouvidos remoíam “Eu ando pelo Recife, noites sem fim. Percorro bairros distantes sempre a escutar: Loanda, Loanda onde estás. Era a alma do preto a penar …”

Saudades de um tempo de paz, felicidade e amor. Cidade de vida artística em ebulição. Muitos jovens talentosos no rádio e no Teatro: José Maria Guilherme, Geraldo José de Melo, Eunice Campos, José de Anchieta, Rosália Pinto, Francisco Cândido, Janda Mesquita, Hilton Paiva, Jorge Ivan Cascudo Rodrigues, Ary Negreiros e até o garoto Marcus Vinícius. Evoco Jaime e Sandoval Wanderley e Clarice Palma, criadora do Clube dos 7. O empresário Francisco Sales, que lançou o Trio Irakitan. Meu Deus, são tantas lembranças, que o coração dói.

Woden, foi importante a sua lembrança. Que PAULO MOLIN tenha o descanso merecido – ele marcou a minha geração!
 
(PUBLICADO NA TRIBUNA DO NORTE de 24/10/2004)
 
OBS.: A notícia que ensejou este artigo foi publicada no Jornal de WM em 09/10/2004.

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