sábado, 14 de junho de 2014


MUITO BARULHO POR UMA PEQUENA CAUSA

Geniberto Paiva Campos - Comissão Brasileira de Justiça e Paz -    DF  - junho/2014

“Vamos fazer as mudanças para que as coisas continuem as mesmas” - ( Lampedusa )

E de repente surge um novo debate o qual deverá posicionar as torcidas nas arquibancadas. Trata-se do decreto sobre Política Nacional de Participação Social/PNPS, um novo edito do Governo Federal, elaborado no elevado propósito de incentivar e regulamentar a participação social nas políticas de governo.
Após três anos de cuidadosa elaboração, segundo as autoridades governamentais, o decreto foi lançado às vésperas das eleições gerais e, como esperado, vem causando impacto e estranheza nos diversos setores do que se convencionou chamar Opinião Pública.
Considerando as explicações dos dirigentes dos diversos escalões do poder executivo, trata-se tão somente de regular o que já existe há vários anos, aperfeiçoando o funcionamento dos Conselhos locais, as Conferências regionais e de âmbito nacional e reorganizar as Audiências Públicas. Assumidas como formas de participação democrática.
No entendimento da chamada Grande Imprensa, de  importantes segmentos do Congresso Nacional e de representantes do pensamento conservador do país, o Decreto não só reduz poderes do Legislativo como cria instâncias decisórias paralelas. Ao contrário da alegada intenção de aperfeiçoamento democrático, poderá ocorrer conflito de atribuições e poderes na esfera do Governo Federal.
Trata-se de um evidente exagero. De ambas as partes em conflito. Ou dos dois lados da arquibancada.
Desde a promulgação da nossa Lei Maior em 1988, consolidando a reconstitucionalização do país, para a qual contribuíram diversas organizações sociais, no chamado processo da Constituinte, vem se buscando formas de participação popular no campo decisório. A questão que se coloca é: como colher e  fazer prevalecer a opinião majoritária da sociedade brasileira no âmago da  Democracia Representativa? Ou, dito de outro modo, como fazer a Democracia Representativa cada vez mais democrática, considerando as novas e interativas formas de comunicação social disponíveis? São perguntas que têm obtido respostas tímidas e gerado decisões equivocadas, na medida em se investe em políticas “conselhistas”, que até agora, se revelaram incapazes de trazer ao processo de tomada de decisão, as expectativas, sequer o pensamento, dos brasileiros e brasileiras. Estes não conseguem colocar as suas decisões no âmbito dos colegiados – conselhos e conferências - formados a partir de uma representação social que se mostra sem organicidade e, portanto, inócua e corporativista.
As elites brasileiras – política, financeira, intelectual, acadêmica – ao longo da história contemporânea, têm revelado a sua incapacidade de ouvir o Povo brasileiro. Mesmo através do Voto, a forma mais simples, direta e eficiente de se colher a opinião popular. Direito que lhe permitido apenas nos “soluços” da Democracia. E que lhe é negado, a cada intervenção autoritária no processo político.
 Após a redemocratização do país, foram criados mecanismos participativos com o nobre propósito de promover a contribuição de toda a sociedade, sobretudo na formulação e execução das políticas sociais dos três níveis de governo. Estes mecanismos, parece, ainda não foram avaliados criticamente. E os possíveis impactos desses colegiados no desenvolvimento  e no controle das ações governamentais permanecem ainda obscuros. O surgimento, na atual conjuntura política, de um decreto de “aperfeiçoamento” desses modelos de participação, teria de soar estranho. Mesmo descontados todos os exageros das reações que provocou.
Caberia, enfim, uma outra questão, talvez mais pertinente, sobre esse tema tão relevante para o aperfeiçoamento do processo democrático: como deveria, então, se dar a participação popular?
Experiências recentes poderiam apontar caminhos possíveis de se obter o efetivo  desempenho da representação popular no controle da gestão dos governos. São ações focais, desenvolvidas a nível municipal, a necessitar de avaliações com bases metodológicas sólidas, que tragam evidências incontestáveis da eficácia do modelo de  participação. Podem ser lembradas as experiências com o Orçamento Participativo. E outras, ainda incipientes, de Planejamento e Gestão Participativa. São formatos que, entretanto, têm um grande mérito: convoca-se o Povo para tomar decisões que afetam o seu cotidiano. E não apenas para ser coadjuvante de uma espécie de teatro popular que, na maioria das vezes, dá sua chancela às decisões dos governos.

 

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