segunda-feira, 8 de setembro de 2014

MILTINHO, OBRIGADO POR TUDO

Sambista Miltinho fez grandes parcerias ao longo de sua carreira Divulgação

Intérprete do famoso samba Mulher de 30, o cantor Milton Santos de Almeida, conhecido como Miltinho, morreu aos 86 anos neste domingo (7) no Rio de Janeiro, segundo informações de sua filha Sandra Vergara.

Sem detalhar a causa do óbito, Sandra postou em uma rede social que o velório de seu pai será realizado no Memorial do Carmo — Capela 3, na capital fluminense,  nesta segunda-feira (8).

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Ainda conforme informações escritas por Sandra, Miltinho apresentava problemas de saúde desde a segunda quinzena de julho e chegou a ficar internado no Hospital do Amaro por cerca de um mês.  

Inclusive, em uma das fotos postadas por ela no dia 14 de agosto, o sambista aparecia sorridente em uma cama de hospital, mas à ocasião respirava com ajuda de aparelhos.


Era de ouro de Miltinho chega ao CD

Aos 85 anos, cantor de ‘Mulher de trinta’ tem sua fase de maior sucesso e suingue, a década de 1960, relançada em duas caixas

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Alguns dos discos de Miltinho reunidos em caixa Foto: Montagem
Alguns dos discos de Miltinho reunidos em caixa - Montagem



RIO - Falou em Miltinho, boa parte dos que o conhecem imediatamente lembrará da “Mulher de trinta”, o seu grande sucesso, lançado em 1958. Foi a música que transformou aquele crooner cheio de balanço, que batia ponto na boate carioca Drink, num dos cantores mais conhecidos do país.
 
 
— A minha mulher de trinta hoje está com noventa! — brinca Miltinho, de 85 anos, há 60 casado com Odilla. — Nós nos conhecemos jovens, no Ateneu São Luiz, no Catete, e logo começamos a namorar. O pai dela jurou me matar, mas depois virou meu amigo.
Histórias de um astro que volta a brilhar com a reedição dos LPs de seu período de maior sucesso: a primeira metade dos anos 1960, quando chegou a lançar três discos num ano. Eles estão em duas caixas, editadas pelo selo Discobertas, do produtor Marcelo Fróes. A primeira junta “Um novo astro” (1960), “O diploma do astro” (1960), “Miltinho” (1961), “Poema do adeus” (1961), “Miltinho é samba” (1962) e “Poema do olhar” (1962). O “Vol. 2” traz “Os grandes sucessos de Miltinho” (1962), “Eu... Miltinho” (1963), “Canção do nosso amor” (1963), “Bossa & balanço” (1964), “Poema do fim” (1965) e “Miltinho ao vivo” (1965).
A voz ao telefone ainda é vibrante, embora entrecortada por eventual falta de ar. Depois de um enfarto, o cantor descobriu ter um enfisema pulmonar.
— Eu não fumava tanto, não em quantidade para ter enfisema — reclama ele, que parou com o cigarro há cerca de cinco anos, mesma época em que fez seu último show, em comemoração ao aniversário de 80 anos, na Sala Baden Powell, ao lado de Doris Monteiro, Pery Ribeiro e Helena de Lima. — Hoje, vou empurrando com a barriga.
Repertório de ouro
As melhores lembranças daquela primeira metade de anos 1960, Miltinho deve ao repertório dos seus discos. E aos compositores, como Luiz Antônio, autor, sozinho, de alguns dos grandes sucessos reunidos na caixa. Além de “Mulher de trinta”, ele fez “Menina moça”, “Ri”, “Poema das mãos” e a favorita do cantor, “Eu e o Rio” (“A melodia mais linda que alguém já fez, uma beleza de letra”, derrete-se ele).
— O Luiz Antônio era coronel do Exército, professor de armamento e frequentador do Drink — recorda-se Miltinho. — Ele não tinha nada a ver com a música, tocava bem era um copo de uísque. Foi ele que me ensinou a beber. Uma pena o Luiz ter me abandonado (o compositor morreu em 1966), se não a gente estaria gravando até hoje.
Luiz Antônio pode ter sido o responsável pelas canções que Miltinho, com seu jeito diferente, balançado, de cantar samba, transformou em hits. Mas ele disputou a voz do amigo com outros grandes nomes da época, como Ataulfo Alves (“Mulata assanhada”), Haroldo Barbosa e Luís Reis (“Palhaçada”, “Só vou de mulher”), Evaldo Gouveia e Jair Amorim (“Serenata da chuva”, “Samba sem pim pom”), Miguel Gustavo (“Samba do crioulo”) e João Roberto Kelly, autor da ferina “Só vou de balanço” (“Nada de twist / de twist e de chá-chá-chá / só vou de balanço / só vou de balanço / Vamos balançar”). Canções líricas, espirituosas, que embalaram muitos romances e as pistas de dança.
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— Eu tinha esse pessoal muito bom, que não volta mais. O tempo anda para a frente. Hoje em dia não se faz mais nada, aquela turma da antiga acabou — lamenta Miltinho. — As gravadoras viviam cheias de autores, eles me procuravam, produziam para mim.
Conformado, o cantor conta que o sucesso só não lhe trouxe dinheiro.
— Mas isso não me importa, sempre tive meu trabalho no Ministério da Fazenda, pelo qual me aposentei. Aqueles foram discos feitos com cuidado, hoje em dia é tudo feito para vender. Mas não é inveja, não. Eu fiz o meu, deu certo, me sinto honrado por ser um cantor de samba — diz Miltinho, para quem “o segredo de um bom samba é dissertar sobre um tema que atinja diretamente o coração do povo, o que não é fácil”. — Mas o segredo mesmo é ser sambista, o que eu sou com muita honra!
Pandeiro no Natal
Carioca, Miltinho nasceu em Botafogo, na Rua Dezenove de Fevereiro. Seus pais nada tinham a ver com música: um contador geral da República e uma professora.
— Eles esperavam que eu fosse um advogado, um médico, algo assim — conta o cantor, que aos 5 anos pediu de Natal um pandeiro, para surpresa da família. — Peguei e saí tocando. Sou um ritmista feito por Deus!
Com seu pandeiro, Miltinho integrou os grupos Cancioneiros do Ar (que existiu no fim dos anos 1930 na Rua Correia Dutra, no Catete), Namorados da Lua (dirigido pelo cantor Lúcio Alves, sucesso nas rádios e nos cassinos), Anjos do Inferno (que o levou ao México, onde viveu alguns anos) e Quatro Ases e um Coringa (“O Coringa era eu”, conta). Já como cantor, foi trabalhar no Drink, com Djalma Ferreira, onde conviveu com músicos que acabariam se tornando famosos, como o organista Ed Lincoln.
— O Djalma não o deixava aparecer muito, porque quando o Ed tocava, dava um banho — confidencia Miltinho, que foi grande amigo de um mito do samba, Ciro Monteiro. — Aquele era um sambista! O Ciro cantava no tempo, quadradinho. Não tinha bossa, mas cantava bonito.
Em qualquer entrevista, não dá para evitar a questão da bossa muito peculiar do cantor. De onde vem isso? Miltinho tem na ponta da língua a resposta: “Normalmente, os cantores vão na cabeça da nota. No meu caso, a harmonia vai na frente e eu canto dois tempos atrás.”
— Com pandeirista, eu tinha que tocar atrás do tempo. E aí comecei a cantar. A Elis cantava dois tempos na frente, adiantada. É mais difícil, porque, se ela errasse, jogava todo mundo no chão — revela o cantor. — O Jamelão tinha raiva de mim, porque não sabia dividir como eu!
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Empenhado em recuperar as discografias das grandes vozes masculinas do Brasil (já fez caixas com Cauby Peixoto, Pery Ribeiro, Agnaldo Timóteo e Moreira da Silva), o produtor Marcelo Fróes fala da emoção de reeditar Miltinho.
— A princípio, ele temia que eu fosse fazer mais uma compilação de sua obra. Ficou surpreso quando informei que reeditaríamos os álbuns tal qual eles eram, e então autorizou a reedição. Já foi emocionante ouvir sua voz ao telefone, ela não mudou nada. Espero encontrá-lo para entregar os CDs em breve.
— Graças a Deus, tive uma vida bem delineada — festeja o cantor, que gravou pela última vez em 2006, no CD e DVD “Acústico MTV 2 — Gafieira”, de Zeca Pagodinho.

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