domingo, 13 de dezembro de 2015

UMA DESCRIÇÃO MOLHADA NAS ÁGUAS DE UM RIO TRISTE, NA PAISAGEM QUE O CORAÇÃO GUARDA E A DOR CHORA.



O GUAPORÉ
Magdalena Antunes, em Oiteiro, cita as impressões do Dr. Luís Carlos Wanderley sobre o Guaporé que se preparava para receber a visita do Bispo da Diocese de Pernambuco, D. José Pereira da Silva Barros:
“[...] A cidade de Ceará-Mirim está assentada na encosta de um monte pouco elevado e em nível superior ao vale, coberto de canaviais e que dali se estende ao norte a se perder de vista: e o Guaporé, que lhe fica em frente a dois quilômetros, o olha da protuberância de um terreno que acidentalmente ali se eleva. É de uma vista bela, pitoresca, aprazível! Em frente um estendal de verduras, perpassado do límpido ‘rio azul’ e implantado de árvores colossais, de folhagem basta e quase azeitonada; adiante a moderna cidade do Ceará-Mirim, que dali se ostenta, linda como um presépio com o seu templo magnífico, ainda por acabar, com a sua importante casa de mercado, a melhor, sem dúvida, de toda a província, com a sua bela casa de instrução que fez o Coronel Manoel Varela do Nascimento, o Barão de Ceará-Mirim e com o palacete do doutor Barros [...]. Para chegar-se à esplêndida casa do doutor Vicente [o Guaporé] cruza-se uma grande porteira do cercado geral que contém os canaviais; depois atravessa-se outra, cujo cercado feito de postes lavrados a quatro faces e perpassados de fio de arame farpado, abrange a casa de varanda, engenho, casa de purgar, banheiros, cocheira e feitoria. Essa segunda porteira estava ali escancarada e sobre os seus mourões erguia-se um marco de canas verdes, coleando com suas folhas terminais. No pátio e em frente da casa de vivenda, corriam enfileirados dois renques de mastros forrados de folhas verdes e sobre cujos cimos passavam iguais arcos, permeados de bandeiras de vivas cores. [...] O jardim, gradeado de ferro que circula toda a casa, é simétrico e está agora florido e ornado de arcos de canas colossais [...]. No centro do jardim e em frente da porta principal da vivenda há um repuxo que espadana água por meio de um tríplice filete que sai da mão de um negrinho de bronze, colocado em pé no meio do tanque. Daí partem muitas veias d´água, que vão regar os canteiros de rosas, cravos e jasmins. Dois galgos de louça branca, sentados sobre as nádegas, nas bordas do tanque, pareciam sentinelas, ali postas a espreitar quem vem de fora”.
Magdalena diz ter entrado no Guaporé pela primeira vez anos depois e nos relata o que viu:
“Nada mais existia do fausto antigo. As flores do jardim murcharam como os que lá habitaram. Apenas os galgos ainda conservam na fisionomia a ilusão de estarem guardando uma riqueza que passou” (In Oiteiro, de Magdalena Antunes, p. 282-286).
E hoje, nem nem mais os galgos existem...
 

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